Crítica | “A Queda da Casa de Usher” é a saída de mestre de Mike Flanagan

Matheus Martins

Desde que colocou os pés na Netflix, Mike Flanagan tem criado uma espécie de nicho próprio que ninguém achou que seria possível em uma plataforma que alocava tantas produções interessantes como Stranger Things, Ozark, Orange is the New Black e muitas outras séries favoritas.

Então foi com a entrada de A Maldição da Residência Hill que os fãs puderam ver que o diretor de Jogo Perdido se adaptava muito bem ao cargo de showrunner. A habilidade de Flanagan em criar histórias próprias, com uma ajudinha do toque literário, proporcionou um modus operandi em Flanagan, onde ele conta seus mistérios de formas episódicas; cada um deles, sobre um irmão.

Ele repetiu esse efeito com Mansão Bly, tentou uma coisa nova em A Missa da Meia-Noite, desapontou alguns fãs com O Clube da Meia-Noite, e fez o mesmo com essa mais nova produção para a Netflix — e é impressionante observar como isso não é algo ruim!

Em “A Queda da Casa de Usher”, somos apresentados à história de Roderick e Madeline Usher, dois filhos frutos de um relacionamento extraconjugal do dono da Fortunato Pharma, que sempre acharam que deveria ser merecedores de todo direito que lhes foi negado.

Anos após finalmente conseguirem serem donos da fortuna que tanto mereciam, Roderick coloca um investimento gordo de dinheiro para que cada um deles possam criar seus próprios negócios e gerenciá-los ao longo do tempo. Os filhos seguem essa mesma premissa, tendo ideias cada vez mais ousadas, de preferência que os coloquem em evidência e cada vez mais próximos da herança de Roderick.

Porém, tudo muda quando Prospero Usher, o mais novo da família, é morto e uma maldição recai sobre a família, que vai sendo dizimada um por um.

Enquanto são assombrados por ilusões diurnas e as visitas de uma misteriosa mulher, a morte anda com cada um desses indivíduos, revelando seus desejos e ambições, tristezas e lamentos, por fim os extremos que seus lados mais obscuros revelam e falam da humanidade, que pode ser o mais podre e gananciosa possível.

Flanagan sempre deitou para as influências literárias que dão aquele gosto único em suas histórias e produções, e escolher o horror e o terror como gênero favorito foi uma bela de uma escolha. A inspiração de anos se transforma em um legado nessa nova série da Netflix que se arrasta por uma trama que não se apressa em mostrar para o que veio, e ser uma saída de mestre de Flanagan da plataforma que ajudou a popularizar suas obras.

Vemos referências a contos de Poe, tanto literais quanto visuais, temas que circulam a morte e a vida em torno de traumas e psicologia, algo que Edgar visitou em seus anos gloriosos de escrita, que se espelha no trabalho de Flanagan em personagens que são cada vez mais destrinchados e naturalmente falhos.

Por mais que saibamos que o fim de cada personagem será aplicado de uma maneira ou de outra, ficamos viciados em assistir a cada novo episódio, ansiosos por saber como cada herdeiro tem seu derradeiro fim, quais os demônios e assombrações que os arrastarão para o precipício antes do deplório final.

Um tema que preocupou bastante diante de tantos elementos foi a modernidade. Seria quase impossível imaginar que o estilo de Flanagan de contar histórias conseguisesse se adpatar à era dos smartphones, dos serviços de streaming e gêneros não binários. O medo foi com que ao trazer essas pautas em evidência, se perdesse a história, e é incrível observar o quanto essa característica não atrapalha, mas ajuda a trazer a série para os dias atuais sem problemas.

Quem assistiu Residência Hill e Bly sabe que é um crime se apegar à favoritos, e o diretor parece ter encontrado a solução para esse problema tornando cada um deles odiavelmente impossíveis de amar, embora há quem se identifique com a gênia Camille de Kate Siegel.

Mas se é para falar de elenco, quem rouba a cena mesmo é Carla Gugino, que mais uma vez traz uma personagem completa, interessante, assustadora, deslumbrante, hipnotizante e admirável. Apenas com um sorriso, um olhar e uma expressão a atriz consegue entregar o papel que a tenebrosa Verna aplica nessa grandiosa história.

Esse pode ser um adeus de Flanagan para a Netflix, mas talvez seja só o começo para o que um dos nomes em maior evidência do horror pode proporcionar para a sétima arte.

Série: A Queda da Casa de Usher

Direção: Mike Flanagan

Elenco: Carla Gugino, Bruce Greenwood, Kate Siegel, Rahul Kohli, Samantha Sloyan, T’Nia Miller, Annabeth Gish, Zach Gilford, Sauriyan Sapkota, Mary McDonnell, Michael Trucco, Carl Lumbly, Willa Fitzgerald.

Nota: 10,00

A Queda da Casa de Usher está disponível na Netflix.

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