Crítica | “Assassinos da Lua das Flores” é alegoria sobre ganância e crueldade

Matheus Martins

Tendo mexido no vespeiro de nicho de filmes de super-heróis meses antes da divulgação do seu filme, o diretor Martin Scorsese retorna para os cinemas com seu mais novo e ambicioso longa, Assassinos da Lua das Flores, um épico “western” (faraoeste) inspirado na obra homônima de David Grann, que também se baseia numa série de crimes do início da década 20 envolvendo o povoado da tribo de indígena de Osage.

Após lutarem por anos contra os americanos pela reivindicação de suas terras e tendo ganhado a porcentagem considerada “ruim” da guerra fria contra o preconceito e afastamento, o destino decide munir a terra com muito petróleo, tornando a vida exclusiva e intocável da tribo rica em uma terra abastada e cobiçada. Muito cobiçada.

O longa foi amplamente divulgado como um dos projetos mais ambiciosos de 2023 uma vez que o Oppenheimer de Christopher Nolan saiu de cena. Agora que está finalmente aqui, nós do Pixel Nerd tivemos acesso ao projeto de Scorsese e temos a nossa crítica sobre o filme. Confira!

Em meio a essa narrativa, se infiltram as histórias de Ernest Bukhart (DiCaprio) e William “Rei” Hale (De Niro), sobrio e tio que vivem suas vidas em torno da ascenção dos Osage. Dispensado de sua infantaria apos um acidente, Ernest passa a trabalhar como taxista para Mollie, uma indígena com a herança incomum herdada de tragédias dos membros de sua tribo. O tio William “Rei” então sugere que Ernest fique próximo a Mollie, um pedido incomum que eclodirá em trágicas proporções de sofrimento.

Os Osage passam a serem mortos um a um, desde os começo da década de 1920 até a união entre Mollie e Ernest, que se apaixonam, se casam e têm filhos. Apesar dos esforços financeiros dos Osage em rastrearem os responsáveis após uma grande perda na família, as mortes não param, causando ainda mais aflito para Mollie e Ernest, que está ciente desde o começo das tramóias do tio que quer botar as mãos no petróleo dos Osage.

O filme tem três longas horas, sendo um desafio que o público-espectador compartilha com o diretor de se concentrarem na história. Graças a deus, o talento de Scorsese no cinema nem sequer ousam em transformar o filme num experimental ala Zack Snyder com cortes lentos e takes demorados. O domínio da câmera é preciso, consistente, engenhoso sem tomar grandes riscos, mas que sucintamente pinta cenários grandiosos. O faroeste sem clichês exacerbados é mais preocupado com a realidade imposta de uma obra baseada não só em uma obra real, mas nos factos reais que denunciam a lama que os Estados Unidos se encarregou de empurrar para debaixo do tapete em seus livros de história.

Quem ouviu os burburinhos da pré-estreia sobre o corte inicial de Assassinos da Lua das Flores ter enfoque um lado mais investigativo, e trazer uma persona de DiCaprio como um investigador real deve ter ficado satisfeito em chegar aos cinemas e ver o influenciável (mas nada bobo), sorridente e envolvente Ernest ganhar vida com a interpretação do ganhador do Oscar. O ator adora se desafiar em projetos que entram de tempos em tempos e estava deixando a desejar um papel tão grandioso que Era Uma Vez em Hollywood e Não Olhe Para Cima não conseguiram proporcionar.

E deve ter sido ainda mais satisfatório para quem chegou desavisado às salas de cinema se deparar com a atuação de Lily Gladstone, não necessariamente uma Orsage de verdade, mas que após a bênção dos envolvidos que trabalham na frente e atrás das câmeras, apresenta uma atuação serena que repassa apenas com o olhar tudo que sua personagem no centro dessa narrativa foi obrigada a passar.

Igualmente arrasador está Robert De Niro que emprega um vilão assustador e manipulador, rei do pedaço, cheio de si que avança sob cada vida indígena executando não pelas suas mãos, mas de empregadores terceirizados que são os verdadeiros assassinos da lua das flores tão quanto ele o é. Sem ser caricato, vemos um vilão controlado e muito realista que denota o quanto a maldade e crueldade humana nunca está atrelada aos moldes que tantos filmes que comportam o espectro herói x vilão tentam nos ensinar de tempos em tempos.

Assassinos da Lua das Flores também cumpre com a missão em não passar o tipo de mensagem moralizada (lê-se errada) sobre valores humanos, sendo responsável em não deixar seu “mocinho” sair impune do caos que perpetuou. Quando um diretor se propõe a ter cuidado com seu trabalho, não saímos do cinema pensando que torcemos para que as coisas tenham dado certo para o dito cujo, mas em conflito a manifestar tais pensamentos, mesmo que o roteiro tenha sido outroa ambíguo em responsabilizar todos os assassinos, nunca sendo direto em admitir o que já é admitido.

O filme é uma alegoria para a crueldade e ganância humana que tira proveito da sua duração para aproveitar bem suas revelações, suas exposições e desfechos, isso sem pecar em excessos seja nos seus prolongados segredos ou idas direto ao ponto. O mais importante é que o público não se sente enganado por amadores que possuem o sabotável medo de acabar por matar seus queridinhos em nome do bem da trama.

Deve-se lembrar que o longa foi vendido também como um suspense (lembre as mortes) e carrega a essência se comprometendo com o material fiel da obra de Grann e das tragédias reais que estão desde a primeira linha do filme até a última, como deveria ser.

Filme: Assassinos da Lua das Flores

Direção: Martin Scorsese

Elenco: Leonardo DiCaprio, Lily Gladstone, Robert De Niro, Cara Jade Myers, Scott Shepherd, Ty Mitchell, William Belleau, Jesse Plemons, Louis Cancelmi, Larry Sellers, Brendan Fraser.

Nota: 10,00

Assassinos da Lua das Flores está em cartaz nos cinemas.

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