Crítica | “Nosso Sonho” é história emocionante que honra o funk brasileiro

Matheus Martins

Compondo a lista de cinebiografias programadas para este ano e o próximo, Nosso Sonho é o longa nacional que retrata a história do duo do funk Claudinho e Buchecha, que fizeram sucesso na década de 90 e continuam a reverberar a fama e o legado agora nas telonas!

O filme está sendo apontado como uma das maiores bilheterias nacionais do mês, o que não é pouco considerando a disputa em outras salas com Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes e Napoleão.

Já assistimos ao filme e temos a nossa crítica à respeito desse tesouro nacional estrelado por Juan Paiva e Lucas Penteado. Confira!

Na maioria das produções focadas em histórias reais da musicalide brasileira, é sempre observado o lugar de retratação que busca honrar figuras importantes para o nosso cenário pop brasileiro, seja isso feito de forma caricata ou com requintes de acontecimentos históricos, datados e, sobretudo, de conhecimento público da memória afetiva do país. É certo afirmar que essas projeções, outrora dramáticas, podem se tornar maçantes se focarem no viés de um mesmo nicho músical que busca considerar apenas um lado da discografia brasileira que é vasta – muito vasta!

É por isso que em Nosso Sonho sabe aproveitar de um terreno fértil: o funk brasileiro e carioca, responsável por pavimentar o caminho para o estilo musical que faz parte da nossa cultura popular hoje mais do que nunca. O longa é tão dramático quanto a leva de filmes que o antecedem, mas com uma pitada de “quê” particular, que une emoção e música em um recorte independente e próprio.

É impossível não se emocionar com o “tururu-cat-tundum” logo nos primeiros minutos que remete aquela nostalgia de eras que nem sonhavam com a modernidade que vivemos nos dias de hoje, quando as tais famigeradas love songs não vinham sempre como uma forma de afronta ou desapego que compõe os tipos de amores modernos dessa sociedade líquida. Dito isso é igualmente impossível não se deixar levar pela história narrada pelo Buchecha de Paiva, que remete aos primeiros dias da infância do duo de sucesso.

Em resumo: Buchecha conheceu Claudinho quando não era Claudinho e Claudinho conheceu Buchecha antes do dia em que o “batizou”, como o próprio conta em determinado momento da história. Antes da música, da busca pela fama, vamos conhecer melhor por onde andou Buchecha antes da vida colocar sua trilha no caminho do seu “faixa”. Descobrimos o relacionamento conturbado com o pai, as dificuldades em se viver em bairros pobres, mas também a delícia de ser apenas uma criança que sente o mundo com itensidade e que olha para o futuro com olhos de desejo.

O bom do roteiro do time Eduardo Albergaria – que além de dirigir também escreve – Daniel Dias, Mauricio Lissovsky e Fernando Velasco ganha força em se ater ao vocabulário realista, sem as falas certinhas que tanto me afastam das producões Globais que são tão irrealísticas ao ponto de doer os olhos. É contando a história do ponto de vista de Claucirlei Jovêncio de Souza que senti uma trama mais próxima de casa, sem apelar para clichês ou a caricatura de algo que só anda pelo filme em espiríto no modo de contar a história.

A atuação de Paiva é perfeita, com aquele velho olhar expressivo que muda como um camaleão que já vimos em produções novelísticas da Globo, mas que aterrissam para dar vida ao risonho Buchecha, mas também ao preocupado Claucirlei, o desacreditado com a fama Buchecha, o apaixonado Claucirlei e o dolorido Buchecha sem Claudinho que – spoiler – já não é mais spoiler pra ninguém.

Para quem não conhece as figuras vai estranhar a forma de falar de Penteado, o que é triste, porque o ator também cumpre seu papel em adaptar fielmente a contraparte do duo que é sempre risonha, “angelical” como descrito pelo próprio narrador, alegre e feliz, mas também solene em momentos chaves. O trabalho de entrosamento entre Paiva e Penteado é digno de invejar com um magnetismo que cola na tela e que expulsa para longe os fantasmas suburbanos da comédia escrachada que só sobrevivem com aquela eletricidade ansiosa que machuca e fere nosso orgulho brasileiro de ser.

Alguns podem reclamar do filme ser muito contido. Já eu acho que ele cumpre bem seu papel, se atendo a uma história fiel e resoluta que é tão íntima quanto grande e que abraça os tempo pelo qual é passada, ao invés de ser engolida nos minutos mínimos que tem para fazer história.

Filme: Nosso Sonho – A História de Claudinho e Buchecha

Direção: Eduardo Albergaria

Elenco: Juan Paiva, Lucas Penteado, Negão da BL, Tatiana Tiburcio, Nando Cunha, Lellê Landim, Clara Moneke, Gustavo Coelho, Boca de 09, Antônio Pitanga, Flavia Souza, Reinaldo Junior, Marcio Vito, Isabela Garcia, Nego Ney.

Nota: 10,00

Nosso Sonho está em cartaz nos cinemas e pode ser alugado em streamings.

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