Como muito sabemos, é só uma questão de tempo até que a fronteira entre elogio e admiração logo cruze os limites da opinião sincera e se torne algo, no mínimo, ofensivo. Com mídias de produção como séries e filmes, esse tipo de cruzamento pode levar tempo, com fãs cansados da mesmice ou simplesmente insatisfeitos com o que o conteúdo entrega.
Quando foi lançado pela primeira vez, o terceiro episódio de The Last of Us foi lançado em meio a um turbilhão de expectativas. Afinal de contas, o jogo adaptado para série é um dos mais emblemáticos da Naughty Dog, vendendo milhões de cópia de uma bela, emocionante e infundada história. Então o que os fãs tanto esperavam da série fosse que o ritmo de adaptação e fidelidade permanecesse o mesmo, já que a fórmula dos dois primeiros capítulos foi tão bem-sucedida.
Porém, quando foi revelado que o 3° episódio focaria no romance entre Bill e Frank, choveram críticas a decisão dos criadores em interpretar a relação entre os dois personagens de uma forma romântica. Outro ponto levantado pelos fãs foi a de que o episódio seria um “filler” deixado ali para ocupar espaço ou – não acredito no que estou prestes a dizer – pintar uma imagem do game “legal” com a comunidade LGBTQIAP.
Embora não estejamos aqui para tomar partido da série do que ela quis ou não passar, essa fonte de críticas impediu os verdadeiros fãs de TLOU de entenderem a importância desse episódio. Repito, os verdadeiros fãs.
Nesse artigo, nós do Pixel Nerd iremos fazer uma análise defendendo a importância do episódio tanto para a série bem como a trajetória de Joel e Ellie.
Olhando para trás
Antes de mais nada, é importante frisar aos desavisados: The Last Of Us é uma história sobre Joel e Ellie. Não sobre armas, não sobre zumbis, o fungo Cordyceps e sua origem. Quando estamos jogando TLOU, essas coisas importam tanto quanto sair vivo e realizar tasks. Mas para o universo da série – que trata mais sobre sentimentos do que qualquer outra coisa – o que importa é a trajetória dessas personagens e como elas se relacionam.
E que baita trajetória. Joel perdeu a filha, ficou separado do irmão, teve que matar para sobreviver em mundo pós-apocaliptíco, fazer novos laços, ver esses mesmos laços sendo destruídos diante dos seus olhos e dizer adeus a comunidade ao qual estava acostumado. Ufa! Imagino só passar por isso tudo e ainda ter que levar uma garotinha insuportável por uma viagem em todos Estados Unidos.
E por falar na tal female duo, as coisas não foram tão fáceis para Ellie também. Órfã, a garota foi jogada de mão em mão por corporações que estavam interessadas de maneira peculiar nela. Ela também teve uma única pessoa que se importava nesse mundo morta diante dos seus olhos, então para ela não deve ter sido nada fácil viver também.
Quando vemos esses dois poros se encontrarem na série, é quase irônico e inacreditável tentar acreditar que esses dois sofreram no passado, mesmo para Joel, de quem acompanhamos a jornada até ali. Ambos parecem que não vão se dar muito bem já que Ellie é volátil e um pouco inconsequente, além de muito observadora e tenaz.
Mas é exatamente isso que faz o terceiro episódio um elemento narrativo tão potente para a série, começando pela importância da relação entre Bill e Frank.
Bill e Frank
A história completa de Bill e Frank em The Last of Us é um pouco diferente nos jogos e na série da HBO. Eles se conheceram logo após o surto e se apaixonaram, vivendo juntos em um bunker fora da Zona de Quarentena de Boston.
Antes disso tudo, é mostrado que Bill não confia em ninguém, principalmente em refugiados que acabam caindo na armadilha do seu quintal. Quando é a vez de Frank cair em sua armadilha, vemos que Bill, apesar de relutante, encontra uma forma de confiar nele e acaba se apaixonando por Frank, com os dois desenvolvendo uma espécie de relacionamento em meio ao cenário apocalíptico, quase isolados de um mundo devastado pelo Cordyceps.
Anos se passam e Frank e Bill começam a ter desavenças. Frank é mais alegre, vívido, cheio de desejos e vontades de reformar a cidade, mesmo que abandonada, e Bill é relutante e nada aberto a diferenças na sua zona de conforto. A coisa só piora quando Bill descobre que Frank convidou Joel e Tess para um almoço em seu lar.
Esses opostos entre as duas personagens é um reflexo da relação entre Joel e Ellie. Desde o momento em que se conhecem, o adulto e a criança se detestam, assim como Bill e Frank, não confiam um no outro e são muitos diferentes nas tomadas de decisões. Ellie é alegre, cheia de perguntas, curiosa como uma criança deve ser; e bastante parecida com Frank. Já Joel é mal humorado como Bill, de difícil confiança e bastante leal aos seus princípios, mesmo que tão pouco.
Quando fica escancarado que a dupla não irá se dar bem, é justamente que eventos catástróficos fazem com que ambos encarem essas diferenças e dependam um do outro durante toda a viagem pelos Estados Unidos. Exatamente como Bill e Frank.
Após Bill e Frank morrer, o episódio 3 volta seu foco para a dupla que é o foco da série. De maneira proposital, vemos Ellie e Joel se provocarem da maneira usual como um indicativo que enquanto uma história de amor acabou de terminar, outra tão grandiosa e não necessariamente romântica acaba de florescer em um mundo devastado pelo apocalipse. Uma relação que será responsável por carregar todos os eventos da série, decisões, eventos, traições, vida e morte.
O episódio 3, Long, Long Time de The Last of Us está disponível com os outros 8 da série no HBO Max.