Crítica: “Fale Comigo” é terror que reflete sobre morte e juventude

Matheus Martins

Após o sucesso de Tudo em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo, a A24, estúdio independente que produziu este e diversos outros filmes de terror considerados “cult”, a produtora anunciou para este ano Talk To Me ou “Fale Comigo”, que estrelou nos festivais de Sundance, Berlim e SXSW.

O filme recebeu diversos elogios da crítica, chegando a uma nota alta de 95% de aprovação, além do selo Fresh. Fale comigo é um horror australiano, que conta com a direção dos irmãos Danny e Michael Philippou, que são conhecidos pelo canal RackaRacka no YouTube.

Nós do Pixel Nerd tivemos a honra de assistir ao filme antes que ele chegasse aos cinemas aqui no Brasil e já temos a nossa opinião sobre essa mais nova obra-prima do terror. Confira!

Fale Comigo é um daqueles filmes que podem ser descritos como “horror elevado”, e que apresenta uma grande história de horror com requintes de uma filosofia própria. O espaço dado ao gênero tem fornecido obras capazes dessa reflexiva sem parar, desde títulos como A Bruxa, Hereditário, O Farol e Nós, de Jordan Peele. Nada disso aqui é diferente na direção dos irmãos Philippou.

No longa, começamos em uma festa, sob a lente de um jovem preocupado procurando seu irmão mais novo em uma festa carregada de música, drogas e bebidas. A câmera faz uma movimentação em contraste com a urgência do rapaz, afinal de contas, o pai do mesmo acabou de morrer e ele precisa alertar seus ente queridos. Porém, há uma surpresa: o jovem antes totalmente chapado (embora ainda não saibamos do quê) não está nada são, e revela isso ao esfaquear o irmão e depois a si mesmo no olho.

Com esse tom, Fale Comigo apresenta a história de Mia (vivida por Sophia Wilde), que acabou de perder a mãe e ainda está digerindo o luto como uma bala muito mal engolida. A jovem não conversa com o pai, e tem uma maior proximidade com a família de sua amiga, Jade (Alexandra Jensen), que tem um irmão mais novo, Riley (Joe Bird) e sua mãe, Sue, vivida pela fabulosa atriz australiana Miranda Otto de O Senhor dos Anéis. O trio, junto de Mia, será a grande vítima de uma série de acontecimentos envolvendo um jogo adolescente com uma mão embalsamada capaz de invocar espirítos.

O jogo funciona da seguinte maneira: você precisa apertar a mão e dizer “fale comigo” e verá um fantasma de alguém morto na sua frente. Logo após isso, existe o segundo desafio, que consiste em dizer “eu deixo você entrar”. Este último é o mais arriscado, considerando que o espríto entra dentro de você e possui você por alguns consideráveis segundos cronometrados.

O filme faz uma alusão direta ao uso de drogas e jogos perigosos e arriscados das redes sociais. Quem aí não se lembra do drama que foi viver a época do infame “Baleia Azul”? Aqui é exatamente igual, com os jovens colocando sua vida em risco e tão pouco se importando com as consequências de um jogo tão macabro. A coisa fica mais complicada quando Riley, até então apenas uma criança aos olhos dos jovens envolvidos no jogo, passa a virar objeto de desejo das criaturas que possuem os jovens, e vira seu principal alvo. Quando ele adentra o jogo pela primeira vez, sua possessão leva mais tempo que o normal e ele se fere gravemente.

No quesito horror, Fale Comigo está de parabéns. É um filme com capacidade de chocar, com duas cenas em particular que prometem deixar qualquer um boquiaberto. Em filmes desse gênero, é comum esperar por um jump-scare em uma hora ali ou outra. Aqui, o susto é prolongado; você olha uma determinada cena que está acontecendo e ela começa a se desenrolar, nunca parando de te deixar cada vez mais assombrado com o que é pintado na tela.

A filosofia de contrastar esse jogo com os diversos riscos exposto aos jovens dessa geração é muito inteligente e funciona de uma forma muito real. Existem aqueles que fogem do jogo, e existem aqueles que ficam ludibriados por ele e não resistem a tentarem mais uma vez, exatamente como um vício em drogas deve funcionar.

Não dá para resumir Fale Comigo apenas nisso. Boa parte da sua premissa, mesmo quando acaba ficando dramática demais e tenta envolver um mistério, é sobre morte, sobre luto, sobre aquela insuficiência que os jovens sentem quando atingem uma determina fase de suas vidas. Mia é uma protagonista que, mesmo quando pensa direito, é inconsequente e isso se dá pelo fato que ela não superou a morte da mãe. Não dá para dizer que ela é uma protagonista forçada já que boa parte do material de divulgação da produção da A24 a colocou como o rosto dessa franquia, e fez isso de cabeça pensada. Ela é, a partir de uma cena em particular, o centro dessa reinvenção macabra do horror.

Uma cena que agrada bastante, durante a possessão de Mia (já apontada em diversos trailers) é como a cena é composta, com a atriz cantando em sincronia com uma trilha de música colocada no filme. É um detalhe que mostra uma produção dedicada e bem trabalhada em cima do que se propõe, mesmo para um filme de horror.

Outro ponto de destaque para o filme é que o mau, quando uma vez liberado, não está preocupado em obliterar todos os protagonistas do filme, como vemos em várias produções norte-americanas. É um mal objetivo, que respeita a limitação dada pelo roteiro e não tenta usar táticas exageradas ou obtusas demais para se mostrar um grande risco para os protagonistas. Ele é demonstrado assim na forma do roteiro e como ele é trabalhado.

Fale Comigo certamente faz jus à sua boa fama pela crítica especializada. É um filme que reinventa o velho terror com um toque de tecnologia e temas relevantes da nova geração, ao mesmo tempo sendo uma mistureba reflexiva e apavorante.

Filme: Fale Comigo

Direção: Danny e Michael Philippou

Elenco: Sophie Wilde, Alexandra Jensen, Miranda Otto, Joe Bird, Otis Dhanji, Zoe Terakes, Chris Alosio.

Nota: 10,00

Fale Comigo chega aos cinemas brasileiros no dia 17 de agosto.

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